História

Trecho retirado do “Plano Diretor de Organização Territorial e Desenvolvimento do Turismo em Conceição de Ibitipoca”, da Fundação João Pinheiro – Novembro de 2000

  HISTÓRIA DO DISTRITO DE CONCEIÇÃO DE IBITIPOCA

   A história do Distrito de Conceição de Ibitipoca está naturalmente relacionada com a história do município de Lima Duarte, a que pertence. Assim, procurou-se elaborar este resumo histórico a partir dos elementos coletados sobre a história de Lima Duarte, na parte que diz respeito a Conceição de Ibitipoca, e, também, focalizar os aspectos específicos do Distrito de Conceição de Ibitipoca.

    Os primeiros habitantes da região foram os índios Aracis, considerados índios mansos, na Serra do Ibitipoca e no planalto de Barbacena, os Cachines no vale dos rios do Peixe e Paraibuna e os Pitas em áreas mais ao Sul (entre a Mantiqueira e o vale do Rio Preto). Havia também os Coroados Puris, considerados ferozes e disseminados na região. (2)

  A penetração dos povos de origem europeia é bastante antiga, iniciada com os sertanistas e bandeirantes. Anteriormente à descoberta do ouro, as incursões paulistas nos vales do rio Doce e do rio das Mortes tinham o objetivo de aprisionar indígenas e conduzí-los a São Paulo, onde eram comercializados ou utilizados em serviços domésticos. As rotas dos sertanistas eram as trilhas indígenas. Além da apropriação dos antigos caminhos, os sertanistas usurpavam os pontos de assentamento indígenas. Muitos dos ameríndios escravizados devem ter retornado à região e transmitido aos bandeirantes as informações sobre as rotas para o litoral do Rio de Janeiro.

   Segundo Augusto de Lima Júnior (3), as primeiras bandeiras, que penetraram o território mais tarde denominado Minas Gerais, depois de vadearem o Rio Grande, subiam o curso do Rio das Mortes até quase as cabeceiras, onde tomavam as margens de um afluente à direita, o Caieiro, localizado no município de Barbacena. Em sequência atingiam o vale do Ribeirão Alberto Dias e, daí em diante, pelos espigões desnudos seguiram pela Ressaca em direção às Gerais, guiados pelo alcantis das montanhas. O Rio das Mortes foi logo reconhecido em todo o seu percurso, e como próximo de suas beiras em direção à Mantiqueira começavam a aparecer florestas colossais, foi dada a designação de Borda do Campo a essa área.

     Em 1664, Fernão Dias Paes em companhia de seu filho legítimo Garcia Rodrigues Paes e de seu filho natural José Dias Paes, atravessou a Mantiqueira, atingiu o Rio das Mortes e a Borda do Campo e prosseguiu até as cabeceiras do Rio das Velhas. Esta bandeira tinha por fim a busca de metais preciosos. Em 1680, Fernão Dias Paes renovou a expedição e em 1685 Garcia Rodrigues Paes e outros bandeirantes partiram também de São Paulo em nova expedição. Seguiram-se às bandeiras de Fernão Dias Paes diversas expedições paulistas de prospecção de metais preciosos.

   A penetração na região de Lima Duarte e Conceição de Ibitipoca é apontada como um dos mais antigos caminhos de Minas. Há referências que datam de 1692 (4), com a “bandeira” do padre João de Faria Fialho. Essa área se localiza um pouco mais ao sul da rota de Fernão Dias, e existem referências (5) de que esse padre era um bandeirante relativamente independente em relação aos demais. Ele foi também um dos pioneiros do descobrimento de Ouro Preto. Em descrição do roteiro das minas de ouro descobertas pelo padre Fialho, que inclui Ibitipoca (6), são apontados vários indícios de ocorrência de ouro na região atravessada, alguns com coleta de amostras. Embora as informações sobre as riquezas propagadas por roteiros de antigos bandeirantes devam ser consideradas com muito cuidado, é importante a menção à região em questão, já conhecida e trilhada pelos colonos portugueses.

    Foi então descoberto ouro em vários locais do atual território de Minas Gerais. Para essas áreas se deslocaram muitos paulistas, pessoas procedentes do Rio de Janeiro e, especialmente, portugueses, que percorreram a rota de Fernão Dias Paes e outras rotas próximas, como a do padre João de Faria Fialho.

   Bento Corrêa de Souza Coutinho, através de carta de 29 de julho de 1694, deu notícia dos descobrimentos de ouro nas Minas dos Cataguases, como a região foi inicialmente denominada, ao governador-geral do Brasil, na Bahia, Dom João de Lencastre. Iniciou-se então o povoamento das Minas de São Paulo ou Minas dos Cataguases, que depois passou a chamar-se Minas Gerais. (7)

    Em 1698, Garcia Rodrigues Paes e Domingos Rodrigues da Fonseca Leme estabeleceram-se no Registro Velho (data da histórica fazenda, local ainda hoje existente), nas proximidades da Borda do Campo, e, em 1699 Garcia Rodrigues Paes concluiu o picadão do Caminho Novo, do Rio Paraíba, no lugar da atual cidade de Paraíba do Sul, até a Borda do Campo. Por volta de 1701-1702, todo o Caminho Novo já estava concluído.

    Nos primórdios da exploração aurífera foi registrada a descoberta de ouro de aluvião no Córrego da Conceição, em Ibitipoca e na região de Lima Duarte, embora o rendimento dessas lavras não tenha sido de grande monta. Em 1715 já ascendiam a dezenas os principais moradores da região de Ibitipoca, pagando onerosos tributos à Fazenda Real pela posse de extensas glebas, datas minerais e 73 escravos, parte do processo colonizador -310 oitavas e JÁ de ouro em pó, o que equivale a mais de 1000 gramas. (8)

    No final do século XVII foi erguida uma ermida tosca dedicada a Nossa Senhora da Conceição. Essa ermida foi substituída por uma igreja de adobe no início do século XVIII, e, em meados desse século, essa igreja precária foi demolida e construíram no lugar dela o templo atual, cuja sagração data de 1768. A construção foi subscrita por um grupo de ricos fazendeiros da região que trouxeram entalhadores, pintores e santeiros de São João dei Rei. (9)

   Na década de 1730, deu-se manifesto ao descobrimento de ouro nos rios do Peixe, Pirapetinga, Paraibuna e Preto. O governador de Minas Gerais, Gomes Freire de Andrade, nomeou autoridades para verificar a extensão das novas lavras, mas concluiu-se que o interesse de alguns potentados residentes na região era a abertura de um caminho, o que facilitaria o contrabando de ouro.

   Em 1755, foi decretada a proibição desse caminho. Deve-se aqui destacar que a região de Conceição de Ibitipoca e outros locais próximos se constituíram em rota de contrabando do ouro no século XVIII, através de um caminho que partia de São João dei Rei, passava por Santa Rita do Ibitipoca, pela localidade denominada Rancharia, por Conceição de Ibitipoca, pela área do Rio do Peixe (Lima Duarte), prosseguindo para Rio Preto e depois para Paraíba do Sul.

   Na primeira metade do século XVIII, esse caminho, após a região da Serra do Ibitipoca, se constituía em caminho clandestino por diversas veredas de desvio do ouro. Rancharia é uma localidade próxima a Conceição de Ibitipoca, localizada a aproximadamente seis quilômetros da sede do distrito. De Santa Rita do Ibitipoca havia também um ramal que ligava esse caminho a Barbacena, a qual se situava no caminho dos Bandeirantes até a região do Rio das Velhas e Ouro Preto, e passou a ser ligada ao Rio de Janeiro através do Caminho Novo das Minas Gerais.

  Por volta de 1780 a ocupação na região de Ibitipoca e Lima Duarte estava circunscrita às regiões serranas e suas imediações. Mantinha-se ainda desconhecido e inexplorado o sertão da Mantiqueira Sul, nas áreas banhadas pelos rios do Peixe, Pirapetinga, Paraibuna e Preto – atuais municípios de Lima Duarte, Rio Preto, Bias Fortes, Santos Dumont, Bom Jardim e Juiz de Fora. (10)

    A causa desse isolamento é atribuída ao seguinte fato, registrado a partir de documentação do governador de Minas Gerais, capitão-general Dom Rodrigo José de Menezes.

   Após as notícias de descobrimento de ouro nessa região do Rio do Peixe e parte sul do sertão da Mantiqueira na primeira metade do século XVIII, a extração, entretanto pouco se desenvolveu. Com o intento de dilatar cada vez mais os seus domínios até o Paraibuna, apossando-se da maior extensão possível de terras de cultura e mineração, o fazendeiro da Borda do Campo, o coronel Manoel Lopes de Oliveira, denunciou o desvio do ouro, ocorrido por veredas secretas abertas naqueles sertões até o sul, na fronteira da Capitania do Rio de Janeiro, veredas essas só conhecidas dos contrabandistas.

   A partir de tal representação (bando de 1735), em 1755, foi decretada pelo governador de Minas Gerais, José Antônio Freire de Andrade o fechamento de todo o sertão da Mantiqueira Sul que incluía terras banhadas pelos rios do Peixe, Pirapetinga, Paraibuna e Preto. A situação continuou inalterada até 20 de fevereiro de 1780, quando o capitão-general Dom Rodrigo José de Menezes, Governador de Minas Gerais, inteirado das descobertas no Rio do Peixe mandou fiscalizar a região e ordenou a elaboração de um relatório, o qual se encontra registrado no Arquivo Público Mineiro. (11)

  De posse das informações, Dom Rodrigo, em 1781, deixou a capital Vila Rica e chegou a Dores do Rio do Peixe onde foi recebido pela população que deixou suas tarefas cotidianas de mineração e agricultura.

   Tornando pública sua intenção de fazer concessões de terra, o capitão general despachou mais de 800 requerimentos, legalizando a situação daquela gente, Deteve-se durante quatro dias na região e, posteriormente, continuou concedendo sesmarias aos posseiros.

   A concessão de sesmarias e a organização de uma expedição para a região deve ser entendida no contexto de uma política de fomento da atividade mineradora, iniciada na década de 1760 pelo governador Luís Diogo Lobo da Silva. Os governadores da segunda metade do século XVIII estimularam a organização de bandeiras e a abertura de caminhos no vale do rio Doce e no sertão da Mantiqueira. Era voz corrente na opinião pública serem estas regiões ricas em metais preciosos. A decadência da exploração aurífera nos antigos núcleos mineradores deveria ser compensada com os novos descobrimentos.

   Mas a atividade mineradora, que trouxe as primeiras fortunas, não teve duração considerável. Três ou quatro décadas depois, a população já dedicava-se à pecuária, criando grandes rebanhos, e à lavoura do café e da cana-de-açúcar, origem de muitos engenhos, atividade econômica que perdurou até os fins do século passado.

    Em 1789, a povoação do Rio do Peixe registra a nomeação de seu primeiro mestre-escola, José Inácio da Siqueira. A propósito, o mestre-escola teve implicações na Inconfidência Mineira, prestando depoimentos vantajosos para a acusação dos conjurados, depondo como testemunha acusatória do coronel José Aires Gomes (12).

   Em Conceição de Ibitipoca nasceu o cónego Manoel Rodrigues da Costa, importante figura que veio a se destacar na Inconfidência Mineira e teve posteriormente grande atuação política nos tempos do Brasil-Nação. Esse padre, nascido em 1754, mudou-se com seus pais ainda recém-nascido, fixando-se em Caetano do Paraopeba (Moeda) e depois em Carijós (hoje região de Conselheiro Lafaiete). Ordenou-se sacerdote em Mariana em 1780 e exerceu o ofício na Fazenda do Registro Velho (Estação de Sá Fortes, próximo a Barbacena). A sua fazenda, localizada no Caminho Novo era ponto de pousada e encontro de viajantes dentre os quais se incluía o Tiradentes. Joaquim José da Silva Xavier em uma de suas viagens em 1789 pernoitou na fazenda Registro Velho e expôs seus ousados planos. O sacerdote, embora simpático à ideia ficou apreensivo e alertou Tiradentes sobre os riscos do projeto, recomendando a ele prudência e moderação. Mas o padre participou da conspiração e foi preso em sua fazenda. Com os bens confiscados, inclusive dinheiro, ouro em boa conta e livros diversos, foi conduzido a Vila Rica, encarcerado com os demais inconfidentes, sendo transferido depois para a Fortaleza de São José na Ilha das Cobras.

    O padre Manoel Rodrigues da Costa foi condenado à forca em 1792 por ter se omitido, sabendo do movimento e não o tendo denunciando; mas por carta de interdição da Rainha, de 1790, e mantida em segredo, os réus eclesiásticos foram conduzidos à corte para melhor deliberação da Rainha. Após seis anos em Portugal e a passagem por diversos presídios e conventos o padre retornou ao Brasil e conseguiu a sua libertação em 1801. Dos seus bens recuperou apenas a fazenda. (13)

    O padre Manoel Rodrigues da Costa foi ainda ardente promotor da independência do Brasil, sendo eleito deputado para a Assembleia Constituinte de 1826. Recebia sempre grande apreço do imperador Dom Pedro I, que em sua última viagem a Minas esteve por uns dias em sua fazenda do Registro Velho, e o condecorou com as Ordens de Cristo e do Cruzeiro, e com a dignidade de cónego da Capela Imperial (14). Além de tudo isso, o padre Manoel Rodrigues da Costa foi agricultor progressista. Saint Hilaire (15), em viagem científica a Minas Gerais, foi visitá-lo e relata que o padre lhe revelou que tinha trazido de Portugal máquinas próprias para tecer o linho e outros tecidos. Na realidade o padre tentou introduzir a indústria de tecidos fabricando alguns tecidos de lã de ovelha e de linho que plantara nas terras dele.

   No século XIX acredita-se que não houve grandes modificações na realidade de Conceição de Ibitipoca. Com a contínua ascensão do povoado do Rio do Peixe, acredita-se que Conceição de Ibitipoca foi perdendo expressão, tornando-se depois uma localidade remota, ficando relativamente esquecida. Deve-se destacar a criação da freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Ibitipoca e a integração do distrito ao município de Lima Duarte, antigo arraial do Rio do Peixe. Em agosto de 1750 o primeiro bispo de Mariana, Dom Manoel da Cruz, criou a Freguesia de Conceição de Ibitipoca, confirmada por ordem real em 3 de novembro desse mesmo ano. (16)

    A instalação da paróquia, porém não ocorreu logo por motivos políticos. Como referência a esse fato é apontada a Provisão Régia de Dom José I, rei de Portugal, em 2 de abril de 1752. A freguesia foi concretizada muito depois, em 23 de setembro de 1818, por ordem de Dom João VI, ficando filiada a mesma as capelas de Santana do Garambéu, Dores do Quilombo (Bias Fortes), São Domingos da Bocaina, Senhor Bom Jesus de Bom Jardim e Senhor dos Passos em Rio Preto. Em 1836, já se encontrava em funcionamento a Irmandade do Santíssimo Sacramento. Nesse ano é apontado que a freguesia apresentava a população de 1306 almas. A matriz da Imaculada Conceição de Ibitipoca vem sendo conservada como sede. Uma das mais remotas paróquias da Arquidiocese de Juiz de Fora, se situa em uma das mais antigas povoações de Minas Gerais.(17)

     O território do hoje município de Lima Duarte pertenceu no início de seu povoamento à imensa Comarca do Rio das Mortes, com sede em São João dei Rei. A partir de 1791, o Distrito do Rio do Peixe foi integrado ao termo de Barbacena. Em 1839, o Rio do Peixe foi elevado a sede de Distrito de Paz e em 1859 foi assinada a lei que lhe conferiu o título de Freguesia, o que equivalia a Paróquia. Em 1881, foi discutido na Assembleia Provincial o projeto de criação do município, elevando o distrito à categoria de vila e anexando-lhe as freguesias de Conceição de Ibitipoca e Santo Antônio da Olaria. A lei de desmembramento de Barbacena foi assinada em 3 de outubro de 1881, mas a instalação do município só se deu posteriormente em 29 de dezembro de 1884, na Vila do Rio do Peixe, que nessa data passou à categoria de cidade com o nome de Lima Duarte.

   O nome foi dado em homenagem ao Dr. José Rodrigues de Lima Duarte, conselheiro do Estado de grande influência em Barbacena, e cunhado do então presidente da Câmara Municipal de Barbacena, Antônio Carlos de Andrada.

   Descendente de família importante da fazenda da Borda do Campo em Barbacena, ele sempre trabalhou para o seu município e a região, foi deputado geral eleito por toda a Província, ocupou a Pasta da Marinha no Império, presidiu a Câmara dos Deputados nos últimos anos da monarquia, foi nomeado senador por Minas Gerais e foi agraciado por Dom Pedro II com o título de Visconde de Lima Duarte, com as Honras da Grandeza.

   Na história de Conceição de Ibitipoca e de Lima Duarte merece também referência a revolução liberal de 1842. Essa revolução se iniciou em Barbacena, da qual também participou o cónego Manoel Rodrigues da Costa. A referida revolução proclamou presidente interino provincial José Feliciano Pinto Coelho da Cunha. O movimento foi, entretanto debelado a partir da vinda da tropa imperial comandada pelo tenente-coronel José Joaquim de Lima e Silva (futuro Conde de Tocantins) e seu irmão, o brigadeiro Luís Alves de Lima e Silva (futuro Duque de Caxias). Caxias avançou para a povoação de Olaria, e depois para a do Rio do Peixe, dirigindo-se em seguida a São João del Rei, Barbacena e, finalmente, a Santa Luzia, onde ocorreu a batalha vitoriosa.

    Embora sem grande expressão econômica ao longo da história de Minas, a região de Conceição de Ibitipoca atraiu cientistas e viajantes estrangeiros, pelas peculiaridades de sua paisagem e de sua flora. Em 1822 o cientista Saint Hilaire assim descreveu a localidade:

(…) atravessamos primeiro a vila de Ibitipoca, que conhecia mal, e julgava ainda mais insignificante do que realmente é. Fica, como já expliquei, situada numa colina e se compõe de pequena igreja e meia dúzia de casas que a rodeiam, cuja maioria está abandonada, além de algumas outras, igualmente miseráveis, construídas na encosta de outra colina.  Não estranha, pois, que inutilmente haja eu procurado, ontem, nesta pobre aldeia, os gêneros mais necessários à vida. (18)

    Em 1822, Saint Hilaire visitou a serra e fez coleta de vários espécimes botânicos, identificando logo as melastomáceas e outras espécies da flora local. Sobre os bosques de Araucária apontou a correspondência com outras áreas da Mantiqueira, desde a Borda do Campo até as regiões do sul do País, como Curitiba e Rio Grande do Sul, passando por certas áreas do Rio de Janeiro: ele já apontava para uma igualdade de temperatura entre esses diversos pontos, funcionando a Araucária como uma espécie de termômetro dessa situação. Esse grande botânico não se ocupou muito das furnas, mas se emocionou ao descrever os campos e as matas:

Fazenda do Tanque, 14 de fevereiro, 1 légua e um quarto. — Como faço questão de subir a Serra de Ibitipoca, onde, sem dúvida, encontrarei muitas plantas, não quis deixar o Rancho de Antônio Pereira sem me por ao corrente de minhas análises. Era muito tarde quando partimos. Depois de subirmos uma encosta bastante íngreme, entramos nos campos. Foi com extremo prazer que tornei a ver uma quantidade desses encantadores subarbustos pelos quais comecei o meu herbário e desde dois anos não mais vira as elegantes cássias e aquelas melastomáceas, cujos fracos e cerrados ramos formam encantadores feixes, arredondados como bolas. Na mata virgem quase que nunca se tem perspectivas, mas a vegetação é tão majestosa e variada, e seus efeitos tão pitorescos que nelas nunca me aborreci.
Os campos, pelo contrário, tornam-se logo monótonos. Quando ao sair-se de sombria floresta, entramos numa campina, descortinando-se, repentinamente, imensa extensão de terreno, quando nos sentimos refrescados por suave brisa que nada impede de circular, quando em lugar de árvores gigantescas, cuja folhagem mal distinguimos, não vemos senão pastos salpicados de flores encantadoras, das quais, de muito longe,’, se percebem a família e gênero, é então impossível que nesta inesperada mudança de cenário não nos ocorra certo deslumbramento. A vista dos belos campos que se apresentaram hoje a meus olhos, não pude deixar de sentir verdadeiro aperto de coração pensando que logo os deixarei para sempre. Todos estes dias vivi na mais penosa incerteza. Sinto muito bem, que não posso ficar para sempre no Brasil. Desejaria, porém, ao menos gozar, por mais tempo, do prazer de admirar este belo país. Quereria poder despedir-me de meus amigos, dos bons amigos dos arredores de  Vila Rica. Também sinto que se fizer esta viagem ser-me-á difícil partir ainda este ano, e se espero poucas satisfações na minha volta à França, não posso calar uma série de obrigações que para lá me chamam. Após muitos embates íntimos e hesitações, resignei-me afinal a encaminhar-me diretamente de Barbacena a São Paulo. Não foram apenas campos que hoje percorremos; atravessamos matas também. Depois de mais ou menos uma légua, chegamos à Vila de Ibitipoca, situada num alto. Embora cabeça de distrito que se estende até Rio Preto, consta esta vila apenas de algumas casinholas do pior aspecto. (19)

   Quanto à área da Serra do Ibitipoca, Teodoro Sampaio aponta que o termo se origina de “ibi ” (pedra) e “oca” (casa, gruta) – montanha partida, ou vulcão. (20)  A expressão “casa de pedra” é aceita pelos indigenistas, podendo estar relacionada às grutas existentes que possam ter servido de habitação aos habitantes primitivos. (21) Existem ainda outras interpretações para o termo.

   Visitaram também a serra e a descreveram uma comissão científica em 1906 e o doutor Alvaro Astolfo da Silveira em 1922, além de outros cientistas em épocas posteriores.

   Na segunda metade do século XX o interesse pela Serra do Ibitipoca começou a aumentar, com alguns visitantes procedentes de municípios próximos que ali se dirigiam com a finalidade de fazer lazer, nos feriados e fins de semanas.

   Em 4 de julho de 1973 foi instituído próximo a Conceição de Ibitipoca o Parque Estadual do Ibitipoca, ao longo de toda a linha de cumeada da serra e vertentes próximas, com uma área de 1488 hectares. A maior parte do parque se localiza no distrito de Conceição de Ibitipoca, município de Lima Duarte, mas uma outra parte do distrito está no município de Santa Rita do Ibitipoca.

  Após essa época a frequência de visitantes ao parque e à sede do distrito tomou impulso, acelerando-se bastante nos últimos anos, caracterizando o turismo como atividade econômica de especial relevância no distrito. Acredita-se que esta seja a principal ação em termos de perspectiva para o futuro, e se for bem conduzida deve se constituir em uma forte e permanente atividade da vida do distrito.

( 2) DELGADO, Alexandre Miranda. Memória histórica sobre a cidade de Lima Duarte e seu município. Juiz de Fora; s.n., 1962.

(3) MASSENA, Nestor. Barbacena: a terra e o homem. [S.l.:s.n.,1985]

(4) CONSELHO DELIBERATIVO MUNICIPAL DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE LIMA DUARTE. Informe histórico do Município de Lima Duarte [Lima Duarte, 19–]

(5) Entrevista com o historiador Márcio Ulisses de Paula , cm Lima Duarte. Governo de Minas Gerais FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO Governo d e Minas Gerais

(6) Roteiro descoberto por Orvillc Derby, na Biblioteca Nacional e publicado na revista do Instituto Histórico de São Paulo c por Pandiá Calógeras na obra “As Minas do Brasil”. (DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit nota 2).

(7) DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(8) DELGADO. Alexandre Miranda, op.. cit. nota 2.

(9) CUNHA, Maria do Carmo Gavoii; BARRA, Antônio; CARVALHO, Waltemberg Sales; Matriz da Imaculada Conceição de Ibitipoca. (S.l: s. n.) 1999.

(10) DELGADO. Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(11) DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(12) DELGADO. Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(13) DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(14) Dom Duarte Leopoldo, em trabalho sobre o clero brasileiro e a Independência. DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(15) SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas provindas do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1975

(16) DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(17) ibid.

(18) SAINT-HILAIRE. Auguste de. Segunda viagem do Rio de Janeiro à Minas Gerais e São Paulo (1822). 2 ed: São Paulo: Nacional, 1938.

(19) SAINT-HILAIRE, Auguste de, op. cit. nota 18

(20) SAMPAIO, Teodoro, apud DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.

(21) DELGADO, Alexandre Miranda, op. cit. nota 2.